Dinossauros tinham penas e são parentes das aves? Entenda a jornada evolutiva que liga esses animais tão diferentes

Reportagem: Natasha Pinelli / Instituto Butantan

Você já viu um dinossauro hoje? Caso não tenha visto, experimente olhar para o céu. Eles devem estar lá: voando raso ou bem alto, descansando nos galhos de uma árvore ou empoleirados nos fios de energia dos postes. Isso porque todas as aves são, também, legítimos dinos. É verdade esse bilhete!

“As aves compõem uma classe de seres vivos que foi resultado do processo evolutivo de um grupo específico de dinossauros, os terópodes. Não há mais dúvidas em relação a isso na ciência”, explica a paleontóloga e líder educacional do Museu Biológico do Instituto Butantan Melissa Padilha.

Batizada de Theropoda, essa linhagem inclui dinossauros carnívoros e bastante velozes, capazes de caminhar sob duas pernas, como os ilustres Tyrannosaurus e Velociraptor. Ao longo da história, os representantes desse grupo passaram por diversas adaptações. Resumidamente, eles foram ganhando atributos que hoje são encontrados nas aves, ao passo que também foram deixando para trás muitas outras características.

Para entender essa jornada fantástica chamada cientificamente de evolução, é preciso viajar no tempo e voltar milhões e milhões de anos no tempo-espaço. Aceita o convite?

Já percebeu o quanto a ema lembra um dinossauro?

Já percebeu o quanto a ema lembra um dinossauro? Imagem: Wikimedia Commons

Então senta, que lá vem a história

Tudo começou há aproximadamente 230 milhões de anos, quando o planeta era bem diferente e os humanos estavam longe de existir. Naquela época, os seis continentes que conhecemos hoje (África, América, Antártida, Ásia, Europa e Oceania) formavam um único bloco – os estudiosos o batizaram de Pangeia – e o clima era bastante quente e úmido no mundo todo, favorecendo o desenvolvimento de enormes répteis.

Até o momento, os registros apontam que os primeiros dinossauros surgiram na região da Patagônia Argentina e no estado brasileiro do Rio Grande do Sul, o que faz deles hermanos latinoamericanos. Durante mais de 160 milhões de anos eles dominaram todas as partes da Terra – para comparar, nós estamos aqui há “apenas” 300 mil anos. “Isso mostra que eles tiveram bastante tempo para se diversificar, ‘ganhando’ e ‘perdendo’ características que deram origem a novas linhagens e espécies de dinossauros”, conta a paleontóloga.

Esse constante processo de perde-ganha é algo natural a todos os seres vivos e foi explicado pelo naturalista Charles Darwin, um dos cientistas mais conhecidos do mundo, em sua famosa Teoria da Evolução das Espécies por Seleção Natural.

O fenômeno acontece porque alguns animais podem nascer com características novas, diferentes de seus antepassados. De vez em quando, essa mudança pode se tornar algo vantajoso e aumentar as chances de sobrevivência do animal em seu habitat. Com isso, também crescem as chances dele se reproduzir e perpetuar a “nova característica” entre seus descendentes, contribuindo a longo prazo para o surgimento de uma nova espécie ou até de uma novíssima classe de seres vivos, como aconteceu com as aves.

Reprodução de um velociraptor com penas

Ilustração de um velociraptor com penas. Imagem: Wikimedia Commons

Dinossauro com penas

Os cientistas perceberam a existência dessa ligação entre aves e dinossauros analisando inúmeros fósseis – restos ou vestígios de animais preservados no solo ou em rochas, que “guardam” evidências valiosas sobre sua existência e atividade na Terra. “Um dos mais emblemáticos foi o do Archaeopteryx lithographica, que mudou completamente a interpretação que existia sobre a evolução das aves”, observa Melissa.

Encontrado no final do século 19 na região da Bavária, na Alemanha, o dinossauro de cerca de 100 milhões de anos era bem diferentão: tinha boca com dentes que lembravam um bico; dois braços que mais pareciam um par de asas – apesar de ainda ter dedos na ponta; pé com garras; e corpo coberto de penas. Depois disso, muitos outros registros foram surgindo e têm ajudado os cientistas a montarem esse complexo quebra-cabeça.

Os estudiosos descobriram que alguns terópodes já apresentavam estruturas que até então eram “exclusivas” das aves, como ossos no peito que deixavam a parte do corpo mais robusta, contribuindo para o bater das asas, e um outro osso nos membros superiores que permitiam ao bicho colocar suas asas para trás. Exemplares da linhagem também apresentavam ossos pneumáticos – com tipos de “furos” no esqueleto –, um detalhe que melhora as condições de voo, e aquele clássico pescoço em formato de “s”.

“Quando olhamos para as aves que estão na base da evolução, como as emas e os avestruzes, essa relação fica bem mais clara. São bichos que se parecem muito mais com a imagem tradicional que as pessoas têm dos dinossauros do que um passarinho”, avalia a educadora do Museu Biológico.

Imagem do fóssil de um Archaeopteryx lithographica

Imagem do fóssil de um Archaeopteryx lithographica. Imagem: Wikimedia Commons

Driblando a extinção

Foi há 66 milhões de anos que os grandes dinossauros “foram de arrasta para cima” e sumiram do planeta. “A culpa pelo desaparecimento costuma ser creditada ao enorme meteoro que colidiu com a Terra no período, mas a verdade é que os dinos já estavam enfrentando tempos difíceis antes disso”, aponta Melissa.

Os problemas começaram quando o movimento das placas tectônicas, que formam a crosta terrestre, promoveu a separação daquele continente único. O deslocamento das enormes faixas de terra – que muito mais tarde se tornariam os continentes que conhecemos hoje – afetou as condições de vida no planeta: o clima ficou mais frio, a natureza mudou e a competição por comida ficou bem mais acirrada.

O impacto do grande meteoro também fez subir uma nuvem de poeira e reduziu ainda mais a oferta de alimentos. Nessa batalha pela vida, saíram vencedores os animais de menor porte, como os pequenos mamíferos e os dinossauros avianos – por outro lado, foi o fim da linha para as outras espécies da ordem, que muitas vezes superavam os 20 metros de altura e pesavam toneladas.

“Podemos relacionar a história dos dinossauros a uma grande árvore com inúmeros galhos. Alguns cresceram mais, outros menos, mas quase todos se quebraram – exceto por um, que mantém seu processo evolutivo até hoje”, conclui Melissa. Esse único galho vivo na árvore dos dinossauros é representado pelas aves, que, até hoje, seguem voando, cantando e encantando por aí.
Esta matéria foi validada pela bióloga e líder educacional do Museu Biológico do Instituto Butantan Melissa Padilha.

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