O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento que acompanha o indivíduo ao longo da vida, impactando diversas áreas, incluindo a comunicação. Adultos com autismo enfrentam desafios únicos na expressão e interpretação de informações, variando de dificuldades em interações sociais a obstáculos na compreensão da linguagem figurativa e no processamento sensorial.
De acordo com Daiane Perrucini, responsável técnica de fonoaudiologia do Instituto Jô Clemente (IJC), organização de serviços e suporte a pessoas com deficiência intelectual, Transtorno do Espectro Autista (TEA) e doenças rara, sem São Paulo, isso acontece porque as pessoas com autismo enfrentam diferenças na percepção e processamento de informações.
“O cérebro de pessoas com autismo pode processar informações sociais de maneira diferente, o que pode afetar a capacidade de perceber e compreender as emoções expressas através de expressões faciais ou do tom de voz. Por exemplo, se alguém disser: “Que bom te ver!” com um sorriso, mas em um tom de voz impaciente, uma pessoa com autismo pode não perceber a contradição entre a expressão facial e o tom de voz, interpretando a frase de forma positiva, sem perceber que a pessoa está, na verdade, irritada ou sem paciência”, explica Perrucini.
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Ainda segundo a fonoaudióloga, por conta da falta de compreensão dessas nuances sociais, a pessoa pode ter dificuldades em desenvolver relacionamentos profundos.
Além da dificuldade de interpretação de pistas não verbais, como expressões faciais e tom de voz, há uma série de outros desafios na comunicação. Veja a seguir.
Principais desafios na comunicação social
1. Compreensão de linguagem figurativa
Metáforas, sarcasmo e expressões idiomáticas podem ser difíceis de interpretar, tornando conversas informais desafiadoras. “Expressões como “chorar sobre o leite derramado” ou “está chovendo canivete” podem ser interpretadas literalmente, gerando confusão”, diz Perrucini.
2. Iniciação e manutenção de conversas
Muitos adultos com autismo enfrentam dificuldades para iniciar e manter diálogos, alternar turnos de fala ou escolher tópicos apropriados para conversação. Isso pode impactar interações sociais e profissionais.
Uma das inúmeras causas pode ser a ansiedade social. “Muitas pessoas com autismo sentem-se ansiosas ou desconfortáveis em interações sociais, o que pode dificultar o início ou a manutenção de conversas, levando a respostas curtas ou ao silêncio, mesmo quando desejam participar”, explica Perrucini.

3. Expressão de emoções e sentimentos
A identificação e expressão de emoções podem ser desafiadoras, dificultando a construção de conexões interpessoais. A comunicação emocional de uma pessoa com TEA pode ser menos explícita e particular que de uma pessoa típica. Pode ser que ela busque outras formas de dizer o que está sentindo, através de desenhos, por exemplo.
4. Respostas inapropriadas
A fonoaudióloga lembra ainda que uma pessoa com autismo pode responder de forma inesperada ou sem o contexto necessário, o que pode gerar dificuldades na comunicação eficaz.
Ecolalia: um capítulo à parte
A ecolalia (repetição de palavras ou frases) pode ser um mecanismo de aprendizado, uma forma de processar informações ou de autorregulação. De acordo com Daiane Perrucini, isso pode influenciar a comunicação de várias formas, podendo por exemplo, limitar a flexibilidade linguística, a adequação ao contexto e acabar gerando mal-entendidos.
Ela explica, no entanto, que com o tempo e intervenções terapêuticas adequadas, é possível ajudar pessoas com autismo a desenvolverem formas de comunicação mais espontâneas e eficazes.
- Ecolalia imediata
Aqui a repetição ocorre logo após a pessoa ouvir uma palavra, frase ou som. Por exemplo, se alguém disser “Você quer comer?” e a pessoa com Autismo responder “Você quer comer?”, isso seria uma ecolalia imediata. Esse padrão pode dificultar a fluência e a naturalidade da conversa, uma vez que a resposta repetida não contribui para a continuidade da interação
- Ecolalia tardia:
Nesse caso, a repetição ocorre após um intervalo de tempo, podendo ser dias, semanas ou até meses depois de ter ouvido a frase ou palavra. A pessoa pode repetir algo que ouviu anteriormente, como uma maneira de organizar seus pensamentos ou processar a informação. Embora isso possa ajudar na compreensão interna, pode dificultar a comunicação social imediata.
- Ecolalia mitigada:
A repetição de palavras ou frases é ajustada ou adaptada ao contexto, não sendo uma réplica exata daquilo que foi ouvido. A pessoa modifica a estrutura ou conteúdo da fala repetida para torná-la mais relevante ou funcional no novo contexto. Por exemplo, se alguém diz “Você quer brincar?” e a criança responde “Brincar, sim”, a resposta é uma adaptação, mantendo a ideia central.
Quais são as melhores estratégias para facilitar a comunicação com uma pessoa com TEA?
Facilitar a comunicação com uma pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) exige abordagem personalizada e o uso de estratégias específicas para cada caso. No entanto, algumas ideias gerais podem ser úteis para superar algumas barreiras de comunicação. A especialista do Instituto Jô Clemente cita os seguintes meios:
Uso de recurso visual
Pessoas com autismo respondem bem a recursos visuais, como imagens, símbolos, quadros de comunicação, quadro de rotina e economia de fichas, por exemplo, que ajuda a organizar as informações, facilita a troca de ideias e compreensão de rotina.
Estrutura e previsibilidade
A criação de uma rotina estruturada e previsível é fundamental para muitas pessoas com TEA. Isso pode ser feito por meio de rotinas visuais ou horários claros que ajudem a pessoa a saber o que esperar. Por exemplo, se uma criança sabe que depois do almoço sempre terá tempo para brincar e depois irá para a escola, ela se sente mais segura e menos ansiosa. Isso facilita a comunicação, pois a pessoa entende os padrões e pode se concentrar mais no que está sendo dito ou feito.
Incentivar o uso de alternativas à fala
Para aqueles com dificuldades de comunicação verbal, a Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA) como aplicativos, pranchas e pasta de comunicação podem ser essenciais. Por exemplo, se um adolescente não consegue se comunicar de forma eficaz com palavras, ele pode usar um dispositivo eletrônico com um aplicativo que converte em fala. Isso pode aumentar a confiança da pessoa ao interagir, pois ela tem uma forma de se expressar de maneira mais eficaz. Vale ressaltar, no entanto, que a avaliação de um fonoaudiólogo é fundamental para garantir a escolha da estratégia mais adequada.
Terapia fonoaudiologica
Fonoaudiólogos desempenham um papel crucial no desenvolvimento das habilidades comunicativas de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Esse trabalho pode incluir o ensino de frases completas, expansão do vocabulário, aprimoramento da articulação, entre outras áreas. Por exemplo, um fonoaudiólogo pode ajudar uma criança a avançar de expressões simples, como “quero água”, para construções mais complexas, como “Eu gostaria de um copo de água, por favor”.
Prática social
Criar oportunidades para interações sociais naturais, como em grupos pequenos ou atividades que envolvem comunicação, pode ser fundamental para ajudar a pessoa a desenvolver habilidades de conversação. Por exemplo, uma atividade simples como um jogo de tabuleiro pode ser usada para ensinar a alternância de turnos em uma conversa, ou um grupo de amigos pode praticar pequenas interações durante uma atividade de lazer, como a pintura ou a leitura de um livro. Isso ajuda a pessoa com Autismo a aprender a manter o fluxo da conversa, a esperar sua vez de falar e a responder de maneira apropriada.
Adaptação na forma de falar
O parceiro de comunicação deve usar uma linguagem clara, objetiva e direta, evitando o uso de ironia, sarcasmo ou linguagem figurada. Muitas pessoas com autismo têm dificuldade em compreender expressões que não são literais. Por exemplo, ao invés de dizer:”Está chovendo canivetes!” para indicar que está chovendo muito, o parceiro pode simplesmente dizer: “Está chovendo muito.” Além disso, ao falar, deve-se evitar frases vagas ou indiretas, como: “Você não se importa de esperar um pouquinho?”, que pode ser confundido com uma afirmação. Frases mais claras e objetivas, como: “Você pode esperar?” são mais fáceis de entender e responder. Isso ajuda a pessoa a processar melhor a mensagem e a reagir de forma mais adequada.
“Essas estratégias, quando combinadas, podem ajudar significativamente a fortalecer as habilidades comunicativas de uma pessoa com autismo, promovendo maior independência e confiança em situações sociais”, finaliza a fonoaudióloga.
Abril Azul
Abril Azul é o Mês de Conscientização do Autismo. Para tratarmos o assunto com respeito e profundidade, a Catraca Livre prepara matérias sobre causas, diagnósticos, estudos, pesquisas, estatísticas, além de histórias de pessoas que vivem com autismo, entrevistas com médicos e psicólogos especialistas e muito mais. Confira tudo aqui.