Quem me dera ser uma cobra: enguias, moreias, piramboias e muçuns até lembram serpentes, mas na verdade são peixes disfarçados

Reportagem: Natasha Pinelli / Instituto Butantan

Assim como existem espécies de cobra que nadam tão bem quanto peixes, também há muitos peixes que parecem serpentes. A semelhança se dá principalmente pelo formato alongado do corpo e, em alguns casos, por conta daquela cara de zangada que certas cobrinhas têm. Entre os peixes muito bem disfarçados, pode-se destacar as enguias (família Anguillidae), as moreias (família Muraenidae), as piramboias (família Lepidosirenidae) e o muçum (Família Synbranchidae).

Com espécies encontradas tanto nas águas doces dos rios, como no mar, a temida enguia pode emitir descargas elétricas capazes de deixar suas presas confusas e assustar os humanos. Apesar de poderem alcançar até 3,5 metros de comprimento, as enguias normalmente preferem viver bem quietinhas, escondidas nos cursos d’água. Por isso, se um dia você avistar uma, já sabe: nem pense em encostar a mão!

Comum em águas mais rasas do Oceano Atlântico, a moreia-listrada pode ser encontrada na região de Fernando de Noronha (PE)

Comum em águas mais rasas do Oceano Atlântico, a moreia-listrada pode ser encontrada na região de Fernando de Noronha (PE). Imagem: João Paulo Marques D’Andretta

Aqui no Brasil, o poraquê (Electrophorus voltai) é um dos integrantes da família das enguias. Natural da Bacia Amazônica, ele é capaz de produzir descarga elétrica de até 860 volts – cerca de quatro vezes a voltagem de uma tomada de 220 volts.

A moreia, famosa por seus dentinhos afiados, também é um peixe de corpo alongado e cilíndrico. Podendo atingir mais de quatro metros, ela gosta de viver nas águas mais quentes das regiões tropicais, subtropicais e temperadas, principalmente em formações de corais e recifes que lembram “cavernas”. Seu cardápio diário de alimentação costuma incluir crustáceos, peixes e lulas. Mais de 200 espécies desse animal já foram registradas – inclusive a famosa moreia-estrelada (Gymnothorax nudivomer), que é capaz de secretar toxinas ao morder, causando dor intensa e inflamação.

Espertinha: de água doce, as piramboias são rápidas na fuga

Espertinha: de água doce, as piramboias são rápidas na fuga. Imagem: João Paulo Marques D’Andretta

Simpáticos e inofensivos

Outros aspirantes a serpentes são a piramboia e o muçum, peixes de água doce com nomes que vêm da cultura indígena. Na língua dos tupis – população originária que vivia na costa brasileira quando os portugueses chegaram no Brasil, no século XVI –, o termo “pirá” significa “peixe” e “mboia”, “cobra”; enquanto “mu’su” significa “escorregadio”. Essa característica, inclusive, é comum aos dois peixes, uma vez que secretam um tipo de muco pela pele. Isso faz com que eles consigam se movimentar rapidamente, escapando de seus predadores e pregando sustos nas pessoas que se refrescam nos rios.

O muçum consegue viver em poças de lama e pode ser encontrado "se arrastando" pelo chão

O muçum consegue viver em poças de lama e pode ser encontrado “se arrastando” pelo chão. Imagem: João Paulo Marques D’Andretta

Outra curiosidade é que piramboia e muçum podem viver longos períodos em áreas de lama, sem água, para escapar da seca. A piramboia consegue essa façanha porque possui pulmão: quando está na água, ela precisa subir à superfície de tempos em tempos para buscar ar. Já o muçum tem uma faringe altamente vascularizada, que funciona de forma similar ao órgão responsável pela respiração. Por isso, durante à noite, é comum encontrá-lo rastejando pelo chão, indo de um corpo d’água para outro.

Essa matéria contou com a contribuição e foi validada pelo biólogo e tecnologista do Laboratório de Ecologia e Evolução (LEEV) do Butantan Fabiano Morezi de Andrade.

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