Investigação sobre venda de sentenças começou após mudança de voto e pedido de ‘reforço’ para desembargador, diz decisão


Uma advogada que atuava em um conflito fundiário denunciou a suspeita sobre a venda de sentenças após ser ‘surpreendida’ com abordagem de outro advogado. Denúncia levou à Operação Máximus, da Polícia Federal. Tribunal de Justiça do Tocantins, localizado na ala norte da Praça dos Girassóis
Divulgação/Vilma Nascimento
A investigação sobre o suposto esquema de venda de sentenças no Poder Judiciário tocantinense começou após uma mudança de voto por parte de um desembargador em um processo de conflito fundiário. A denúncia foi feita por uma advogada após receber um pedido de ‘reforço’, de outro advogado, para garantir um voto em julgamento.
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As informações estão na decisão do ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autorizou a Polícia Federal a cumprir mandados de prisão, buscas e ainda afastou o desembargador Helvécio de Brito Maia Neto – considerado a figura principal do esquema -, e o juiz José Maria Lima.
A Operação Máximus foi realizada no dia 23 de agosto. São apurados crimes de corrupção ativa, exploração de prestígio, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Processo com tramitação ‘obscura’
Conforme a apuração da PF e Ministério Público Federal, a advogada denunciante representava uma das partes de um processo que envolvia disputa de propriedades rurais. Segundo o relato, o juízo de primeira instância deferiu liminar em favor da outra parte, causando “surpresa” na profissional.
Após esse resultado, ela entrou com dois recursos contra a decisão no Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO). A advogada informou à PF que a tramitação dos recursos na segunda instância ocorreu de forma “obscura”.
Na primeira sessão de julgamento, o relator e o revisor votaram a favor de seus clientes. Uma desembargadora, que atuava em substituição, pediu vista dos autos e depois apresentou voto contrário ao pedido da advogada.
Segundo a investigação, um desembargador investigado já havia votado à favor dos clientes da advogada, mas depois pediu vista e mudou o voto na sessão seguinte, seguindo a divergência da desembargadora. Os nomes dos magistrados não foram citados nessa parte da decisão.
Outro fato que chamou atenção da advogada foi que um outro advogado, indicado como “pessoa ideal para tratar de conflitos fundiários no âmbito do Tribunal”, a procurou no intervalo das sessões para dizer que o marido de uma desembargadora “estava negociando os votos” e ela precisaria dar um “reforço ao desembargador investigado para que ele não mudasse o voto”.
A advogada denunciou a situação e apresentou um dossiê, que gerou uma investigação preliminar e acabou desencadeando uma operação para investigar advogados, juízes, desembargadores e até servidores do governo estadual.
“Por meio de diligências da Polícia Federal, foi possível constatar, então, que o agravo mencionado, de fato, fora desprovido por maioria, nos termos do voto da desembargadora em substituição, que foi acompanhada pelo desembargador investigado”, diz trecho da decisão assinada pelo ministro do STJ.
O documento não especifica em que ano ocorreu o processo ou quando a advogada fez a denúncia do suposto esquema.
Viaturas descaracterizadas da Polícia Federal na frente do Fórum de Palmas
Ana Paula Rebhain/TV Anhanguera
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Operação Máximus
A investigação da PF indica a existência de suposto esquema de venda de decisões judiciais por desembargadores e juízes do TJTO, crimes de corrupção passiva, exploração de prestígio, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Também são investigados advogados e outros agentes.
A decisão que autorizou a operação aponta Helvécio como principal vínculo entre os investigados no esquema. Ele seria a figura principal para direcionar decisões judiciais no TJTO e, ainda, indicava quais magistrados seriam promovidos a desembargadores para ‘facilitar’ o esquema que vendia sentenças para favorecer empresas e órgãos públicos.
Helvécio de Brito Maia Neto assume a presidência do TJ em 2019
Divulgação/Tribunal de Justiça
Além do afastamento dos magistrados, foram presos filho do desembargador Helvécio, Thales André Pereira Maia, e o advogado Thiago Sulino de Castro. O g1 procurou os advogados de Helvécio Maia e do filho Thales, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem. O advogado de Tiago Sulino disse que ira “se manifestará nos autos do procedimento que corre em sigilo”.
O Tribunal de Justiça foi procurado para se posicionar sobre a decisão do STJ que a TV Anhanguera teve acesso na quarta-feira (28), mas não houve resposta até a publicação desta reportagem. No dia da operação, divulgou nota informando que “defende a apuração dos fatos com lisura e transparência e continua à disposição do STJ e da Polícia Federal para contribuir com as investigações”.
Além dos dois mandados de prisão preventiva, 60 ordens de busca e apreensão foram cumpridas no Tocantins e em outros estados, inclusive no Fórum de Palmas e na sede do Tribunal de Justiça.
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