BOLO ENVENENADO: Quantidade de arsênio em saco de farinha impressiona; veja as revelações da perícia

O caso do bolo envenenado, que resultou na morte de três pessoas da mesma família às vésperas do Natal, passou por um trabalho pericial meticuloso.

A atuação técnica do Instituto-Geral de Perícias (IGP) levou a resultados impressionantes, não só na análise das vítimas, mas também em relação à quantidade de arsênio encontrada no próprio alimento e no saco de farinha, onde Deise Moura dos Anjos, de 42 anos, teria colocado o veneno para matar a sogra Zeli Teresinha dos Anjos, 61, e seus familiares.

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Perícia em bolo envenenado  | abc+



Perícia em bolo envenenado

Foto: Sofia Villela/Ascom IGP

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A perícia confirmou que a farinha usada no preparo do bolo tinha uma concentração de 65g de arsênio por quilograma, cerca de 2,7 mil vezes maior do que a encontrada no próprio alimento. Para se ter uma ideia da quantidade, o professor Rafael Linden, do mestrado de Toxicologia da Universidade Feevale, informou à reportagem que é necessário a partir de 100mg de arsênio para intoxicar alguém.

Foram analisadas mais de 90 amostras de diferentes materiais, contando com o trabalho integrado nas perícias de local de crime, necropsia, e exames químicos e toxicológicos. O processo das amostras e o fornecimento de dados e resultados foram realizados pelo Laboratório Federal de Defesa Agropecuária do Rio Grande do Sul (LFDA/RS), por meio de parceira com o IGP.

O que foi encontrado nas vítimas

Os materiais biológicos de Maida Berenice Flores da Silva, 58, Tatiana Denize dos Anjos, 43, e Neuza Denize dos Anjos, 65, as vítimas no litoral norte, foram os primeiros a passar por análise. Naquele momento, o IGP analisou o conteúdo estomacal, o sangue e a urina das vítimas. Pelo nível muito elevado de arsênio, constatou-se que seria incompatível alguma contaminação ambiental. 

“Exames realizados nas vítimas fatais revelaram níveis de arsênio no sangue entre 20 a 60 vezes acima da concentração inicial da faixa considerada tóxica em seres humanos, afastando por completo a hipótese de intoxicação alimentar, ou de contaminação ocupacional, acidental ou natural”, informou o órgão público.

Na coletiva de imprensa realizada pelas autoridades na última sexta-feira (10), a diretora Instituto-Geral de Perícias (IGP), Marguet Mittmann, informou que Tatiana apresentava a maior quantidade no organismo, com 385mg, seguida de Paulo Luiz dos Anjos, com 264mg. O homem é sogro da suspeita e marido de Zeli, falecido em setembro do ano passado e exumado para perícia no começo de janeiro. Inicialmente, a morte do sogro foi dada como intoxicação alimentar, mas o envenenamento foi confirmado após o trabalho do IGP neste ano.

A diretora do IGP salientou ainda que o arsênio pode perdurar no ambiente ou no organismo por vários anos, o que garantiu o resultado positivo do laudo pericial das vítimas.

O que é a necropsia pós-exumação

O IGP explica que a necrópsia pós-exumação consiste no estudo necroscópico, que é um exame para determinar a causa da morte, quando esta for violenta ou houver suspeita de morte violenta após a retirada do cadáver da sepultura, a fim de realizar uma perícia médico-legal. É indicada quando, mesmo recomendada, a necrópsia não ocorreu; ou nas situações em que a necrópsia foi feita, mas não responde a indagações surgidas no decorrer da investigação.

Nem gosto, nem cheiro

A delegada Sabrina Deffente esclareceu que Deise fez pesquisas por “veneno”, “veneno para matar pessoa”, até encontrar uma reportagem sobre Aqua Tofana, um produto criado no século 17 para que esposas eliminassem seus maridos abusivos. “Ela pesquisou uma receita de veneno que fosse inodora, sem gosto, e chega então em uma composição química que ela tenta montar [Aqua Tofana]. A gente percebeu isso através das compras que ela efetuou em sites, e a partir dessa combinação de elementos, ela começa a tentar envenenar familiares”, disse a delegada na última sexta-feira.

“A olho nu é imperceptível ver que há uma modificação ou alteração nesses produtos [contaminados com arsênio]”, esclareceu Marguet.

Para a Polícia Civil, “há fortes indícios de que ela tenha praticado outros envenenamentos de pessoas próximas à família, e que vão ser objetos de investigação”. O sangue do marido de Deise, Diego Silva dos Anjos, e do filho do casal serão analisados pela perícia com o objetivo de identificar se há presença de arsênio no organismo. A mulher segue presa desde o dia 5 de janeiro.

“O que a gente mostrou aqui [na coletiva] é uma virgula do que está por vir ainda”, complementou o delegado Marcos Veloso, que conduz a investigação.

Entenda o caso

O caso do bolo envenenado veio à tona no dia 23 de dezembro de 2024, quando seis pessoas de uma mesma família buscarem atendimento médico após consumirem o doce durante uma confraternização, em um apartamento, em Torres.

Naquele dia, Zeli perdeu duas irmãs, Neuza Denize Silva dos Anjos, 65, Maida Berenice Flores da Silva, 58, e a sobrinha Tatiana Denize Silva dos Anjos, 43, filha de Neuza. 

A sogra de Deise ficou internada até o dia 10 de janeiro, quando recebeu alta hospitalar. Além dela, o filho de Tatiana, também ficou no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, em Torres, mas acabou liberado no dia 3 de janeiro. Ele permanece com o pai no litoral norte. 

Um homem foi liberado após atendimento médico ainda na data do envenenamento.

A sobremesa havia sido preparada para uma confraternização em família por Zeli, na casa onde que vive em Arroio do Sal, no litoral norte. Todos que consumiram o doce passaram mal pouco tempo depois. João Joaquim dos Anjos, 70, marido de Neuza, sobreviveu e conversou com a reportagem sobre quando os sintomas da esposa e filha começaram, bem como o sentimento de luto.

Inicialmente, a Polícia Civil trabalhava com duas hipóteses: de envenenamento e de intoxicação alimentar. A segunda hipótese, entretanto, foi descartada assim que as análises preliminares apontaram para a presença de arsênio no bolo.

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Foto: Sofia Villela/Ascom IGP

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